quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Mulheres Brasileiras que Fizeram História - Aracy de Carvalho Guimarães Rosa

Sobre o selo
Essa emissão é composta por seis selos, celebrando seis Mulheres que fizeram e fazem história. A sexta homenageada é a mulher que arriscou a própria vida para salvar outras, a heroína Aracy de Carvalho Guimarães Rosa. A imagem é uma foto que foi tirada entre 1939 e 1945. O elo desta emissão é o símbolo da mulher, que consta em todos os selos. A folha com borda na cor magenta, é composta por 18 selos, tendo o título da emissão no canto superior esquerdo e no canto superior direto desenhos estilizados de corações e uma capa de passaporte. Foram usadas as técnicas de fotografia e computação gráfica.
Foto: Acervo de família - Arte-finalização: Jamile C. Sallum e Daniel Eff
Dimensão selo: 26 x 44 mm - Lançamento 4 de dezembro de 2019
* transcrito do Edital 32, Correios do Brasil

Aracy de Carvalho Guimarães Rosa

       Os selos postais, desde o seu surgimento, em 1840, na Inglaterra, iniciaram a grandiosa missão de propagar a história universal e de comunicar os grandes e abnegados feitos daqueles que se dedicaram à construção de valorosas obras em vários contextos socioculturais. Assim, o primeiro selo postal do mundo, o penny black, exibia a efígie da Rainha Vitória, perpetuando o perfil de uma soberana inglesa, reconhecida por sua coragem e determinação frente aos desafios de sua época. Daí compreendermos que o selo já nasceu predestinado a marcar com nobreza os fatos por ele assinalados.
      São inúmeros os selos postais brasileiros dedicados às mulheres e suas obras. É gratificante verificar o quão nobre tem sido a presença da mulher na Filatelia, destacando a sua função em vários contextos, mostrando que as mulheres estão cada vez mais conscientes dos papéis que desempenham na sociedade. É, portanto, compreensível e justo que mulheres valorosas tenham as suas contribuições e os seus valores perpetuados em selos postais, que são os mensageiros da paz universal. 
       Os selos postais chegaram ao século 21 comunicando personalidades, obras e aspectos artísticos, históricos, sociais, ambientais e desportivos, que o Brasil e o mundo precisam reverenciar. Nesse contexto, as mulheres têm desempenhado um papel cada vez mais importante na sociedade, vencendo lutas de vários significados, buscando assegurar seus direitos frente a uma vida digna, segura e pautada no respeito à liberdade, à igualdade e defesa de seus ideais. 
       Mais uma vez, a filatelia brasileira tem a honra de emitir selos sobre mulheres. Agora será a vez de Mulheres que Fizeram História, destacando seis personalidades vencedoras em suas vidas. São elas: Elza Soares, Hortência Marcari, Hebe Camargo, Carolina Maria de Jesus, Maria da Penha e Aracy de Carvalho Guimarães Rosa. As mulheres merecem essa honraria, que também dignifica e enriquece a Filatelia brasileira. Esses selos representam o reconhecimento do Brasil e do mundo à história de vida, de trabalho e de força que as motivaram em suas jornadas.
     E no sexto e último selo da série, chegamos à história da mulher que arriscou a própria vida para salvar outras, a heroína Aracy de Carvalho Guimarães Rosa, (Rio Negro/PR, 20 de abril de 1908 — São Paulo/SP, 03 de março de 2011). 
    Por meio deste selo, a Filatelia conta a história do “Anjo de Hamburgo”, como Aracy ficou conhecida e marcada pela luta em defesa da vida, representando exemplo de coragem e amor ao próximo. Aracy era filha de pai brasileiro e mãe alemã. Ainda criança, mudou-se com os pais do Paraná para São Paulo casando-se em 1927 com o alemão Johann Eduard Ludwig Tess, de quem se separou cinco anos depois. 
       Corajosa, voltou os olhos para uma Alemanha que vivia o apogeu das ideologias que sustentavam o movimento totalitário comandado por Adolf Hitler. Mudou-se para a Alemanha com o filho Eduardo Carvalho Tess, de apenas cinco anos de idade, não hesitando ante as privações que teve de encarar para iniciar uma nova vida em um país com cenário político, sociocultural e econômico afetado pela intolerância e pelo ódio que o nazismo disseminava, oprimindo e matando os judeus sob o seu jugo. Em meio a esse ambiente, no qual se instalaram o medo e o pânico, Aracy provou que ali poderia dar uma grande prova de amor à vida, pela paz.
     Em 1936 encontrou trabalho no Itamaraty, assumindo a chefia da Seção de Passaportes do Consulado brasileiro em Hamburgo. Em sua jornada no Consulado, mesmo sabendo que o Governo de Getúlio Vargas havia restringido a entrada de judeus no Brasil, por meio da Circular Secreta 1.127, Aracy ignorou esse documento e continuou a emitir os vistos para os judeus, possibilitando a entrada destes em nosso País. 
     Aproveitando-se do fato de despachar pessoalmente com o cônsul-geral, Aracy colocava a papelada dos vistos em sua mesa, para assinatura, sem identificar com a letra “J” os documentos dos judeus requerentes dos vistos de saída do país. Assim, ajudou incontáveis famílias judias a escapar dos campos de concentração de Adolf Hitler. Essa foi uma clara ação de resistência de Aracy, pois sabemos que o Holocausto representou o extermínio em massa de cerca de seis milhões de judeus nos campos de concentração. Entre eles, não estão os judeus que essa mulher, de grande coração e coragem, encaminhou para as terras brasileiras.
       Aracy fortaleceu a sua missão de salvar do holocausto aqueles que ela pode retirar do ambiente nazista, mesmo arriscando sua própria vida. Ela achava injusta a perseguição contra os judeus. Presenciou atrocidades e acontecimentos daquele período, com a sensação de estar em um grande campo de batalha, empunhando a única arma que conhecia, e que, diariamente, disparava de seu grande coração: o amor ao próximo e aos ideais de paz. Era o anjo certo no lugar certo. 
       Mulher bonita e de caráter marcante, em 1938, Aracy conheceu João Guimarães Rosa, um dos maiores escritores brasileiros, que acabara de ser transferido para Hamburgo. Mesmo sabendo das transgressões de Aracy na Seção de Passaportes, Guimarães Rosa a apoiou nessa prática, que também considerava justa, porém perigosa. Esse fato explica a paixão que surgiu entre os dois, tornando-os cúmplices em tão nobre empreitada. Uniram-se ainda na Alemanha, quando Guimarães Rosa era Cônsul-Adjunto. O casal permaneceu naquele país até 1942, quando o Brasil rompeu relações Diplomáticas com a Alemanha, passando a apoiar os aliados da Segunda Guerra Mundial. A união de Aracy e Guimarães Rosa foi oficializada na Embaixada do México, em 1947, no Rio de Janeiro.                  Nosso escritor dedicou sua obra “Grande Sertão: Veredas”, publicado em 1956, à companheira, justamente por seus princípios e valores. Aracy foi sepultada no Mausoléu da Academia Brasileira de Letras, ao lado de seu marido, no Cemitério de São João Batista, no Rio de Janeiro.
       Por sua coragem, determinação e ideais voltados à missão de defender a vida dos oprimidos e vulneráveis em meio a ambientes marcados por guerras e violência, Aracy de Carvalho Guimarães Rosa merece o reconhecimento de seu País e das Nações que a homenagearam. Além de ser considerada, pelo Governo de Israel, “Justa entre as Nações”, também recebeu honrarias do Museu do Holocausto de Washington e de Jerusalém. 
         Este selo postal tem a função de contar a História de Aracy, que foi pautada pelos riscos em suas decisões com o objetivo de salvar vidas, justamente por ignorar as ideologias de intolerância, de injustiça e de crueldade que marcaram aquela época. Porém, como muitos indivíduos que fizeram resistência e agiram para mudar a conjuntura do período, o Anjo Aracy lá esteve presente. 
Maria de Lourdes Torres de Almeida Fonseca 
Escritora, Cadeira 35 da Academia de Letras e Música do Brasil - AL

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