Sobre o selo
Essa emissão é composta por seis
selos, celebrando seis Mulheres
que fizeram e fazem história. A
sexta homenageada é a mulher que
arriscou a própria vida para salvar
outras, a heroína Aracy de Carvalho
Guimarães Rosa. A imagem é uma
foto que foi tirada entre 1939 e 1945.
O elo desta emissão é o símbolo da
mulher, que consta em todos os selos.
A folha com borda na cor magenta,
é composta por 18 selos, tendo o
título da emissão no canto superior
esquerdo e no canto superior direto
desenhos estilizados de corações
e uma capa de passaporte. Foram
usadas as técnicas de fotografia e
computação gráfica.
Foto: Acervo de família - Arte-finalização: Jamile C. Sallum e Daniel Eff Dimensão selo: 26 x 44 mm - Lançamento 4 de dezembro de 2019 |
* transcrito do Edital 32, Correios do Brasil
Aracy de Carvalho Guimarães Rosa
Os selos postais, desde o seu surgimento, em 1840, na Inglaterra,
iniciaram a grandiosa missão de propagar a história universal e de
comunicar os grandes e abnegados feitos daqueles que se dedicaram à
construção de valorosas obras em vários contextos socioculturais. Assim,
o primeiro selo postal do mundo, o penny black, exibia a efígie da Rainha
Vitória, perpetuando o perfil de uma soberana inglesa, reconhecida
por sua coragem e determinação frente aos desafios de sua época. Daí
compreendermos que o selo já nasceu predestinado a marcar com nobreza
os fatos por ele assinalados.
São inúmeros os selos postais brasileiros dedicados às mulheres e suas
obras. É gratificante verificar o quão nobre tem sido a presença da mulher
na Filatelia, destacando a sua função em vários contextos, mostrando que
as mulheres estão cada vez mais conscientes dos papéis que desempenham
na sociedade. É, portanto, compreensível e justo que mulheres valorosas
tenham as suas contribuições e os seus valores perpetuados em selos
postais, que são os mensageiros da paz universal.
Os selos postais chegaram ao século 21 comunicando personalidades,
obras e aspectos artísticos, históricos, sociais, ambientais e desportivos,
que o Brasil e o mundo precisam reverenciar. Nesse contexto, as mulheres
têm desempenhado um papel cada vez mais importante na sociedade,
vencendo lutas de vários significados, buscando assegurar seus direitos
frente a uma vida digna, segura e pautada no respeito à liberdade, à
igualdade e defesa de seus ideais.
Mais uma vez, a filatelia brasileira tem a honra de emitir selos sobre
mulheres. Agora será a vez de Mulheres que Fizeram História, destacando
seis personalidades vencedoras em suas vidas. São elas: Elza Soares,
Hortência Marcari, Hebe Camargo, Carolina Maria de Jesus, Maria da
Penha e Aracy de Carvalho Guimarães Rosa. As mulheres merecem essa
honraria, que também dignifica e enriquece a Filatelia brasileira. Esses selos
representam o reconhecimento do Brasil e do mundo à história de vida, de
trabalho e de força que as motivaram em suas jornadas.
E no sexto e último selo da série, chegamos à história da mulher que
arriscou a própria vida para salvar outras, a heroína Aracy de Carvalho
Guimarães Rosa, (Rio Negro/PR, 20 de abril de 1908 — São Paulo/SP, 03
de março de 2011).
Por meio deste selo, a Filatelia conta a história do “Anjo de Hamburgo”,
como Aracy ficou conhecida e marcada pela luta em defesa da vida,
representando exemplo de coragem e amor ao próximo. Aracy era filha de
pai brasileiro e mãe alemã. Ainda criança, mudou-se com os pais do Paraná
para São Paulo casando-se em 1927 com o alemão Johann Eduard Ludwig
Tess, de quem se separou cinco anos depois.
Corajosa, voltou os olhos para uma Alemanha que vivia o apogeu das
ideologias que sustentavam o movimento totalitário comandado por Adolf
Hitler. Mudou-se para a Alemanha com o filho Eduardo Carvalho Tess,
de apenas cinco anos de idade, não hesitando ante as privações que teve
de encarar para iniciar uma nova vida em um país com cenário político,
sociocultural e econômico afetado pela intolerância e pelo ódio que o
nazismo disseminava, oprimindo e matando os judeus sob o seu jugo. Em
meio a esse ambiente, no qual se instalaram o medo e o pânico, Aracy
provou que ali poderia dar uma grande prova de amor à vida, pela paz.
Em 1936 encontrou trabalho no Itamaraty, assumindo a chefia da Seção
de Passaportes do Consulado brasileiro em Hamburgo. Em sua jornada
no Consulado, mesmo sabendo que o Governo de Getúlio Vargas havia
restringido a entrada de judeus no Brasil, por meio da Circular Secreta 1.127,
Aracy ignorou esse documento e continuou a emitir os vistos para os judeus,
possibilitando a entrada destes em nosso País.
Aproveitando-se do fato de despachar pessoalmente com o cônsul-geral,
Aracy colocava a papelada dos vistos em sua mesa, para assinatura, sem
identificar com a letra “J” os documentos dos judeus requerentes dos vistos de
saída do país. Assim, ajudou incontáveis famílias judias a escapar dos campos
de concentração de Adolf Hitler. Essa foi uma clara ação de resistência de
Aracy, pois sabemos que o Holocausto representou o extermínio em massa de
cerca de seis milhões de judeus nos campos de concentração. Entre eles, não
estão os judeus que essa mulher, de grande coração e coragem, encaminhou
para as terras brasileiras.
Aracy fortaleceu a sua missão de salvar do holocausto aqueles que ela
pode retirar do ambiente nazista, mesmo arriscando sua própria vida. Ela
achava injusta a perseguição contra os judeus. Presenciou atrocidades
e acontecimentos daquele período, com a sensação de estar em um
grande campo de batalha, empunhando a única arma que conhecia, e que,
diariamente, disparava de seu grande coração: o amor ao próximo e aos ideais
de paz. Era o anjo certo no lugar certo.
Mulher bonita e de caráter marcante, em 1938, Aracy conheceu João
Guimarães Rosa, um dos maiores escritores brasileiros, que acabara de ser
transferido para Hamburgo. Mesmo sabendo das transgressões de Aracy na
Seção de Passaportes, Guimarães Rosa a apoiou nessa prática, que também
considerava justa, porém perigosa. Esse fato explica a paixão que surgiu entre
os dois, tornando-os cúmplices em tão nobre empreitada. Uniram-se ainda na
Alemanha, quando Guimarães Rosa era Cônsul-Adjunto. O casal permaneceu
naquele país até 1942, quando o Brasil rompeu relações Diplomáticas com a
Alemanha, passando a apoiar os aliados da Segunda Guerra Mundial. A união
de Aracy e Guimarães Rosa foi oficializada na Embaixada do México, em 1947,
no Rio de Janeiro. Nosso escritor dedicou sua obra “Grande Sertão: Veredas”, publicado
em 1956, à companheira, justamente por seus princípios e valores. Aracy
foi sepultada no Mausoléu da Academia Brasileira de Letras, ao lado de seu
marido, no Cemitério de São João Batista, no Rio de Janeiro.
Por sua coragem, determinação e ideais voltados à missão de defender
a vida dos oprimidos e vulneráveis em meio a ambientes marcados
por guerras e violência, Aracy de Carvalho Guimarães Rosa merece o
reconhecimento de seu País e das Nações que a homenagearam. Além
de ser considerada, pelo Governo de Israel, “Justa entre as Nações”,
também recebeu honrarias do Museu do Holocausto de Washington e
de Jerusalém.
Este selo postal tem a função de contar a História de Aracy, que foi
pautada pelos riscos em suas decisões com o objetivo de salvar vidas,
justamente por ignorar as ideologias de intolerância, de injustiça e de
crueldade que marcaram aquela época. Porém, como muitos indivíduos que
fizeram resistência e agiram para mudar a conjuntura do período, o Anjo
Aracy lá esteve presente.
Maria de Lourdes Torres de Almeida Fonseca
Escritora, Cadeira 35 da Academia de Letras e Música do Brasil - AL
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